Pesquisa em parceria com a UFRPE retrata adoecimento dos trabalhadores do setor financeiro
Assédio no trabalho bancário é discutido no segundo dia de seminário na Fundaj
Os resultados preliminares de uma pesquisa sobre o adoecimento dos trabalhadores bancários foram apresentados na segunda mesa O trabalho dos bancários: repercussões na saúde mental, no I Seminário Mundos do Trabalho. O evento reuniu o pesquisador Maurício Sardá, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), integrantes do grupo de Trabalho Labor (UFRPE) e a direção do Sindicato dos Bancários de Pernambuco na sala Aloísio Magalhães , campus Derby da Fundação Joaquim Nabuco.
Em um contexto de racionalidade neoliberal, inserção de novas tecnologias e reestruturação do trabalho, a pesquisa traz como ponto central a descaracterização do papel do bancário — compreendido enquanto vendedor de produtos, consórcios, empréstimos — e a sua desvalorização com a polivalência. Dentro desse cenário mais integrado ao sistema financeiro, o assédio no ambiente de trabalho tem cada vez mais adoecido os trabalhadores e trabalhadoras em uma demanda crescente por maior produtividade.
Segundo as mestrandas Mylena Galdino e Ingrid Barbosa do grupo Labor(UFRPE), que entrevistaram 20 trabalhadores de bancos públicos e privados em todo o estado, 65% dos entrevistados afirmam fazer uso de serviços psicológicos e psiquiátricos devido ao assédio institucional relacionado, principalmente, à pressão por metas e resultados. Ingrid menciona que “há a extensão das relações de trabalho para a vida doméstica, em que não há separação entre sujeito e trabalho, vida privada e pública” e muitos reconhecem que “o banco é a minha vida”. Para Mylena, existe uma captura da subjetividade dos trabalhadores que é moldada para que pensem e incorporem que é uma empresa, que precisam produzir mais para se desenvolverem.
O modelo de gestão apontado tem como um dos fatores estressores a atualização diária do “ranking de produtividade" que expõe os trabalhadores e incentiva a competição entre os colegas de trabalho. Outros problemas verificados na pesquisa qualitativa são a exigência constante de certificação e aperfeiçoamento, a vigilância indevida, a crise moral com a ruptura da ética profissional, o acúmulo e desvio de função, o estigma das pessoas adoecidas e sua descartabilidade. Neste último caso, uma de suas implicações é que os profissionais temem revelar o adoecimento e por isso, se automedicam.
Muitos relatos de trabalhadores e trabalhadoras foram trazidos à tona para evidenciar o assédio moral e sexual sofrido no ambiente profissional, que para a equipe à frente da pesquisa “não esperavam a profundidade do adoecimento da categoria”, aponta Mylena. Um dos mecanismos mais recorrentes que intensificam e invisibilizam o sofrimento psíquico adotado pelas empresas é a “salinha de reintegração”. Quando o bancário voltava de licença médica, era forçado a se isolar dos demais colegas em uma sala e lá era impossibilitado de realizar seu trabalho.
“A gestão do medo é diariamente implementada pela instituição a partir da avaliação de desempenho e da possível perda de comissão ou cargo, com o ócio forçado como punição”, afirma o diretor de saúde do Sindicato dos Bancários de Pernambuco, Alan Patrício Menezes Silva. Segundo ele, os bancários se tornam cúmplices desse processo de banalidade do mal — referente à atividade do gestor — e vivem em uma luta ideológica. “Não se pode naturalizar as ferramentas de opressão quando os trabalhadores se veem e são vistos como colaboradores”, explica.
A luta contra os assédios
Desde 2000, o Sindicato dos Bancários atua contra o assédio sexual. Entre os anos de 2000 e 2005 produziu uma cartilha sobre assédio moral que, devido à luta do sindicato, foi reconhecido pelo INSS como um acidente de trabalho. Alan afirma que o sindicato vem tentando criminalizar o assédio moral e a diretora do financeiro da entidade, Maria Bethânia Montarroyos Vasconcelos, afirmou que este ponto já está incluso na atual Convenção Coletiva de Trabalho para discussão com o patronato, mesmo com a resistência da categoria.
O sindicato cita um estudo realizado em 2023 pela Federação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro do Nordeste (Fetrafi/NE) no qual se verificou que 25% dos casos no INSS de afastamento por doenças mentais e comportamentais são de trabalhadores bancários. Os bancários são uma das principais profissões mais adoecidas, segundo o sindicato. “Em cada dez bancários, sete tomam algum tipo de medicação”, aponta Maria Bethânia.
A entidade ainda denuncia que mesmo com o crescimento do sistema financeiro, sobretudo no período pandêmico, houve uma redução de dois mil postos de trabalho no ano passado e a pressão aumenta sobre os funcionários que ainda estão no setor. O trabalho cada vez se torna mais precarizado em um ambiente adoecedor. “Os bancários que eram uma categoria estruturada também estão sofrendo esse processo de precarização e que atinge o emocional de forma tão forte quanto ou até mais que outros trabalhos que não são registrados, trabalhos considerados informais”, sublinha Mylena, que participou desde o processo de registro dos relatos até a produção final da pesquisa.
Para o diretor Alan Patrício, a parceria com a UFRPE na construção da pesquisa ajudará a mobilizar mais setores da sociedade civil contra as causas do assédio que tem levado ao adoecimento e a altas taxas de suicídio. “Com a pesquisa finalizada vamos procurar todos os entes públicos de defesa contra essa prática, como o Ministério do Trabalho, a Delegacia Regional do Trabalho e Emprego e a Assembleia Legislativa. A ideia inclusive é chamar toda a classe trabalhadora e a classe acadêmica que estuda o tema para fortalecer nessa luta e combate.” Outra finalidade é a formação de um conselho consultivo de movimentos sociais na pós-graduação da UFRPE para refletir os resultados do atual levantamento, enfatiza o coordenador da pesquisa e professor da UFRPE, Maurício Sardá.
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